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quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

Travessia


"Além da fala e da mente, no rio de luz sempre-fulgente, meu coração mergulha." 
        Sri Chinmoy

Os três atos de fé



Supernova é o nome dado a corpos celestes surgidos após a explosão de estrelas e que
têm um brilho de grande magnitude.Em poucos dias ela  libera mais energia que nosso Sol
 em toda a sua vida.É a morte espetacular de uma estrela.
É o fim ou o começo de uma vida?

Queria palpar essa ínfima linha que acompanha a vida e a morte, o sonho e o despertar. Queria morrer, agarrando-se à essa linha tênue que liga essas duas dimensões, por amar, sobretudo, a própria vida. Acredita que toda morte tem um tanto de plenitude e queria ser plena ao se fundir ao infinito.

E todas as noites ela morria. Mas não era uma simples morte. Era um entregar-se ao inevitável: sem resistência, como num gesto de redenção. Morria para sentir a ressurreição. Foi assim que encontrou uma forma de sentir-se viva pois  acreditava que a encarnação acontece várias vezes:

Nesta mesma vida.

Procura um amor que a preencha toda, cada célulinha do seu ser, e para sempre. Está demasiadamente cansada dos amores passageiros. Já morreu tanto com eles que está vazia e quer ser preenchida por uma avalanche de amor, mas que seja repousante e eterno em seu ser.O não efêmero amor, mas aquele que atravesse-a como uma flecha no tempo. Quer remar e remar e atravessar o rio, chegar na outra margem. Quer atravessar o pântano que é a sua alma, quer  colapsar o espesso véu de ilusão que encoberta seus olhos para então ser ser verdadeiramente aquilo que já se é no fundo, ocupar seu lugar. Ser o vazio plenamente cheio de nada. Silêncio e realidade. A grande dimensão.

Tudo isso pra falar que foi assim que tomou uma dose de coragem e se despediu. Sentia como se fosse em direção ao matadouro. Já chorava antes de encontrá-lo pois despedia-se daquela parte que era ele, nela. Num único espaço-tempo de verdade, ajoelhada em seu quarto, confessa a sua entrega, onde acontece sem saber, o verdadeiro encontro com o sagrado. Era o momento derradeiro do adeus, de uma vez por todas. Começava a morrer, len-ta-men-te. Seu coração estava sangrando. Elevava seu coração aos Céus e permitia que toda a fragilidade de sua alma fosse entregue às mãos das mais superiores instâncias Celestes. Seu primeiro ato de fé

Para fazer isso foi preciso apoiar-se em algo, no escuro.
- "Uma mão! Estenda-a pra mim, um dedo, se quer.Dai-me um só ponto fixo, meu Deus!"

É agora que essa moça necessita daquele fio que a conduz  das trevas para a luz, aquele mesmo fiiiio que interliga a morte à vida, que é fixo, sólido e estável diante de toda essa impermanência. Ela quer um chão seguro.
Despedia-se com sinceridade daquela parte que resistia em morrer, por tanto tempo e que insistia em alumiar com esperança algum canto de escuridão, insconscientemente, daquela pobre alma vã. E por deixar morrer, sabia que teria que remanejar toda a sua estrutura interna. Recolher o que sobrou de si, juntar e colar os pedaços remanescentes. Estranhava-se, não se reconhecia. (Quem sou eu?) Procurava debaixo do armário aquele caco que ainda reconhecia como seu e cautelosa e pacientemente, dia-a-dia colava em si, num gesto de amor próprio. Renascer. Refletir a nova luz da aurora, aceitando a máxima e inexorável sentença: a impermanência de todas as coisas e a certeza de que, futuramente, tudo se quebrará novamente. E caminha. Faz então, seu segundo ato de fé.
Ela amou-o. Amou o seu ser, toda a sua ignorância e sua ilusão, inclusive a ilusão que ele nela criara, naquele espaço fora do tempo, onde aconteceram todos os passeios românticos de férias. As horas em silêncio que ela tanto reclamara, entendeu que eram os momentos em que estava realmente na presença dele, perceptível somente pela insistência daquele seu silencio maldito. O modo como ele pousava a mão dele no braço dela bastava para que ela se sentisse plenamente envolvida.Os olhares, os gestos, essas coisas simples, ternas, eternas e singelas eram o que mais lhe custava a se despedir, causando um peso à memória e ao coração.
Mas algo não se aquietava e sem resistir, aceitava por fim, o fim. Assim, confusamente. Algo lhe dizia que nessa vida, aquele era o momento da morte dos dois.
E despediram-se. A despedida ironicamente concedia-lhe forças, por saber que estava empoderada de seu poder de escolha, estava imbuída de livre-arbítrio. Foi tudo num tempo reavaliado, onde cada suspiro contava um incalculável tempo na eternidade. Neste nosso tempo regular diria que foi cruelmente pouco, (pois quem não acha que esse tempo é implacável e cruel?) mas o necessário para que duas almas estivessem em presença. Como já dizia Clarice Lispector, a eternidade é o estado das coisas neste momento. E foi, eterno e natural, naquele momento. Um abraço verdadeiro e poucas palavras, pois não havia muitas a serem ditas, mesmo, pois os corações sabiam-se um ao outro.
E foi com honra à vida e ao coração (que dita não carregar nenhum ressentimento) que ela pôde dizer adeus sem carregar nenhuma mágoa nem raiva, para que assim continuasse livre para ser o que é e o que lhe espera para ser. Sem espaço para arrependimentos mas sim uma abertura para se perdoar o que se foi e o que não gostaria ter sido, e o que gostaria de ter feito e não se fez. Porém, reconhecendo que foi como tinha que ser, por fim, agradece-o. A despedida num gesto de gratidão. É esse o sentimento que tem que preponderar, ainda que tenha havido uma grande tristeza entre os dois.
E é então que uma força dentro de si, estende-lhe a mão, uma mão que estava soterrada dentro dela e que aparece após toda essa longa escavação que fizera, sem ao menos se dar conta. E por fim, sente que faz uma experiência de abertura, de liberdade: a palavra de ordem de sua gloriosa juventude. E então, o vazio preenche espaço. E ela renasce como o bendito fruto da vida, novamente.

E então, com a única coisa que acha que sabe, caminha: que tem que manter o coração livre e seguir o que ele dita. E obedece, com amor. Sem saber o que está por vir, confia.
E faz por fim, seu terceiro e último ato de fé.



quinta-feira, 10 de novembro de 2011

Soldier of love

Soldier of love
I have won the battle of doubt

Being the guardian of my heart
On this endless wait for my love
Is where I begin a new start


Love took me far
To the depths of my being


Where I went some many times to die


But I am reborn and I´ve survived


From this painfull heart´s war


Now I am more than alive


Back to what is real


I am ready again for what may come


On the love´s battlefield.

quarta-feira, 19 de outubro de 2011

Dijesus


“Tudo na vida pode ser relativo, menos Deus e a fome.”- Dom Pedro Casaldáliga

Eu ouvi recentemente essa frase num documentário sobre Dom Pedro Casaldáliga  - "E o verbo se fez carne",  antes de pegar esse menino pretinho pra mim. Ele é preto e branco, como a sua vida e a fome, sem relativizar. Ele tem olhos grandes de jabuticaba, ranho escorrendo pelo nariz e parece não ter força nem para chorar direito. Seu rostinho é de tanta dor que basta, para que eu ouça seu choro estridente.
 Quando o sol incide sobre ele sem misericórdia, ele nem sabe quem é.Se a sombra ou se ele mesmo.Só sabe que existe porque sente fome. E porque dói. Muito. Deve ter nascido em algum país da mãe África, a mãe mais triste desse mundo. Sua segunda mãe deve ter morrido de AIDS ou fome, ou pode ser que tenha sido vendida para uma outra tribo, ou mesmo, morrido em algum outro parto.
Foi quando ele olhou pra mim, com tanta súplica, que eu arranquei-o da revista.Tive pegá-lo pra mim. Batizei-o de Dijesus, sem pai mas com mãe.Sua terceira mãe sou eu, e carrego esse menino preto na bolsa comigo, chorando de dor para onde quer que eu vá. Tudo o que pude fazer para o garoto foi esquentá-lo na minha bolsa quentinha de veludo por dentro onde eu carrego também todos os meus sonhos.

Por mais que ele chore, estará quentinho e acompanhado.Eu não vou me esquecer dele. E agora ele está comigo. Quem sabe eu não olhe pra ele e lembre sempre que existe uma dor, muito maior que a minha. Eu, nessa vida tão mesquinha, preciso da existência do Dijesus para me lembrar de lutar sempre.


quinta-feira, 6 de outubro de 2011

Vem ser fruto comigo

 Pântano das Almas, 6 de Primavera


Meu querido Grão,

Estou como um solo, só.Sola e fertil, à sua espera.Saiba que o amor é assim, precisa de um encontro para germinar.Só assim é possível saber se ele vai vingar, se o tempo vai podar ou se vai dar frutos.Sou um amor de solo quente, que quer ver nascer, que tem sede de tanto esperar, e tem saudade.Quero poder encontro-germinar com você, criar raízes, viver e sermos plantas, enfrentar tempestades, balançar ao vento e quararmos juntos ao sol. Crescer e durar junto à você ao longo do tempo, naturalmente e sem pressa, como mandam as leis da natureza.Prometo nutrir a esperança e fazer valer a minha promessa.

Mas cadê você? Deixa eu te conhecer, vem pra esse amor poder acontecer. Vem e me diz que não és um grão de ilusão -estéril, mas cheio de promessa, para sermos juntos então, sermos frutos e servirmos à quem estiver com fome de justiça, liberdade e amor.

Vem ser fruto junto comigo, grãozinho.Vamos semeaer nossos ideais e sermos o Sal da Terra - essa terra tão insípida.Vem meu grão de amor, fique ao meu lado para podermos enxergar um horizonte maior, na soma dos nossos olhos.Os meus, solos, precisam dos teus.

Te espero fertilmente,

Raíz

domingo, 21 de agosto de 2011

Não sei se é sonho

M.C.Escher - Three Worlds -1955
Eu quero ser e só
Simples e suavemente
Como quem anda
Só e paciente
Como quem vive
E aceita
Plenamente
Os fatos da vida
O mistério da vida
Resignada
A realidade
Ser isso e mais nada
Sempre presente
Dentro de mim
Ser um coração
No agora
Pertencente
A mente sem ilusão
Ser o mundo
Reflexo de tudo
E de passagem
Não deixar passar em vão
Nenhum só segundo

domingo, 22 de maio de 2011

A Júlia


Rosa e Azul (As meninas de Caven D´Anvers)-Renoir

Em 2007 foi quando saí de casa e vim para Ribeirão.Sair de casa é como um segundo corte do cordão umbilical e  a segunda vez  dói mais porque é você quem decide cortar para renascer para a maturidade. Saí e lá fui eu respirar sozinha com meu pobre pulmão asmático.Deixei o cachorro, a casa, os amigos, meus pais, meus irmãos, minhas irmãs e entre elas a Júlia, minha irmã caçula.

A Júlia é uma estrela de alegria e espontaneidade que todo caçula carregar por ter o posto de poder ser criança por mais tempo na família.Ela é do tipo de pessoa que facilmente te invade e te desconserta de você mesmo, te fazendo rir e rindo ainda mais de você.O olhar dela parece estar sempre procurando o lado engraçado e bizarro das coisas e nas pessoas.A Júlia guarda também uma carência e uma densidade, profundas e secretas, que se revelam com o pedido de carinho antes de dormir, no meio de uma conversa que se estende ao longo da noite, dentro de um quarto escuro e de portas fechadas.

Eu me lembro que quando ia pra casa nos finais de semana tentava ficar o tanto que eu podia junto dela. Ela adormecia me pedindo pra ficar e pela de manhã minha mãe me pedia para ir embora sem me despedir, assim ela não acordava e não chorava. Eu chorava escondida e silenciosa eu saía sem me despedir, com o coração partido.

E assim por um tempo foi: Todo final de semana, aquela mesma ida, aquela mesma volta, aquela mesma paisagem nas viagens de ônibus (que só se alternava quando eu sentava na poltrona da outra fileira), aquela mesma dor.Até descobrir um dia que, sempre que ia e voltava, eu já não era mais a mesma.

Chegava em Ribeirão às segundas-feiras.Fazia parte do trote da faculdade usar uma camiseta de cada cor na semana e  justo na segunda era o dia do azul.Eu me vestia de azul e o azul se vestia em mim.

E foi assim que nasceu esse poema:

Blues
Às vezes me visto assim de azul
E todas as suas nuances desfazem em mim
O outono na cadência de maio
Explode sua natureza em cores  no Céu
De manhãzinha as cores se escondem
No choro de um azul bebê
Eu passo silenciosa
Para não acordá-la
Assim ela não chora
Assim ela não me vê
Tem dias que eu me pego azul clarinha, azul tristinha
Eu choro escondida
E lá no fundo azul do Mar
Vou de mansinho, me azulo marinho,marinho
Marinheira eu sou
Então tiro minhas nadadeiras aladas do meu bolso
E vôo sozinha num mergulho infinito
Num mar de águas que me conduzem à mim mesma
Pego meu pó de lirismo mágico e azulaido em alma
Tudo o que existe
É quando tudo torna a ganhar vida
Conversando comigo nos meus devaneios
(E até mesmo no meu tempo regulamentar)
Mas tem hora que tudo explode em sete cores
Numa dança espetacular
Azul-crinando como numa intempérie
O Céu do meu coração
Azul
É que essa minha condição humana me traz esses azuis
Dos quais nunca estarei salva
Me quebrando uns azulejos do peito
e azulindo outro novos.
Então eu me lembro
Das suas incontáveis tonalidades
E minha alma se acalenta outra vez.


quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

Landscape of Port Lligat - Salvador Dalí

Um barqueiro sábio sob a luz das 11 horas me indicou a direção através de uma faixa anil e algumas flores que havia no meu caminho. Contou-me que dois seres alados descarregavam água do mar do Céu Azul.
"Tome um pouco dessa água vida com as suas mãos" - disseram me os seres. Peguei um pouco, tomei a água com as minhas mãozinhas e sai.
Descobri que para tomar vida é preciso abrir cada vez mais as mãos, para podermos tomarmos ainda mais e até mesmo abrir mão do que temos para receber mais e mais vida. Hoje essa água flui no meu corpo e me faz viva, viva.

sábado, 1 de janeiro de 2011

Domingos

Hoje eu me perguntei sobre o que há nos Domingos.Acho que é o dia que a gente mais desacelera da semana e entra em contato com a gente mesmo, mas com aquela nossa parte mais triste.Será que simplesmente entrar em contato com a gente seja mesmo uma coisa triste? Ou será que a gente é sempre triste e só nos silêncios dos domingos isso vem a nos revelar? Não sei.Pode ser também que haja uma conjução entre os planetas no Céu, que traga uma aura de tristeza a nós humanos, mais nostálgica, porque não sou somente eu que sente isso, eu sei.Ou pode ser simplesmente o silêncio das ruas, o gemido das mulheres nuas, o barulho das correntes das bicicletas, aquele tempo morto, o céu sempre limpo, o meu pobre coração no limbo. Aquelas nuvens onde cabem todos os nossos sentimentos e pensamentos e que nos transportam para um tempo distante, trazendo a lembrança de alguém: como um canto infinito de um pássaro que se perde ao longe.